Augusto Mateus: sábio do Qren e consultor de empresas sem conflito de interesses?

PawlaKuczynskiegoPalavrasDoPolíticoVãoParaASarjeta

O governo anunciou semiclandestinamente a nomeação de um «comité de sábios» para o assessorar na «arquitetura do Qren». O QREN  é o programa estatal que canaliza fundos da União Europeia para investimento no nosso país. Um desses quinze sábios é o Doutor Augusto Mateus, que exerce a atividade comercial de consultor de empresas. Quinta-feira passada a imprensa publicou uma daquelas notícias oficiosas que não são dadas em conferência de imprensa: «o Governo não vê qualquer distorção de concorrência, e Mateus não entende como é que poderá ter vantagem a assessorar a “arquitectura” do novo QREN». O Economista Português explica a seguir o que o governo e o Doutor Mateus declaram não entender.

  • A comissão proporá processos e por certo critérios que darão o dinheiro do contribuinte a uns investidores e negá-lo-ão a outros. O Doutor Mateus conhecê-los-á antes dos restantes cidadãos portugueses os conhecerem; e conhecerá também a reação do governo a esses processos e critérios. Esse conhecimento vale ouro e, dado que o Doutor Mateus declara não compreender como «pode ter vantagem», é legítimo deduzir que por certo o partilhará gratuitamente com os seus clientes – com o aplauso do governo.
  • A nomeação da comissão é uma bofetada sem mão na administração pública e em particular nos ministérios das Finanças e da Economia aos quais a lei atrribui as competências normativas e o orçamento dá os meios técnicos para assessorar o governo na elaboração do QREN, e são desapossados das suas competências legais em favor de uma administração pública paralela.
  • A nomeação da comissão é também uma bofetada sem mão na AIP, na CAP, na CCP, na CGTP-IN, na CIP, na UGT e noutros parceiros sociais. Num Estado Democrático de Direito, o Governo teria anunciado que consultava os parceiros sociais, quer os patronais quer os sindicais.
  • O governo disse oficiosamente querer nomear representantes do PS para essa comissão mas está assim a desacreditar as comissões especializadas da Assembleia da República, nas quais esse partido – e outros por certo – estão representados. Aliás, se o PS mandou homens seus para a dita comissão, comportou-se de modo tão condenável como o governo.
  • A nomeação de comissões ad hoc deste tipo é desconhecida em Estados Democráticos de Direito, não por haver dúvidas sobre a honestidade pessoal dos seus hipotéticos membros, mas sim por gerar inevitáveis e numerosos conflitos de interesse – de que o caso do Doutor Mateus é um óbvio exemplo, sem que nada prove que seja caso único. Essas comissões lembram os Precs ou o Império Centro-africano. Mas estamos num Prec? Vivemos num Império Centro-africano?

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